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segunda-feira, 22 de setembro de 2014

A conferência de Jerusalém

Melhor do que o termo Concílio fica o termo Conferência, pois não se trata da reunião de muitas igrejas, mas somente de duas, a de Antioquia e a de Jerusalém.

Lc coloca esta narração no centro do livro para lhe dar destaque e importância. A conferência estabelece a unidade entre a igreja Antioquia e a de Jerusalém. A conferência dá

legitimidade e continuidade a Paulo. Ele continua a história de Israel, de Jesus e dos Doze. Paulo não fundou nova religião.

O capítulo 15 é todo de Lc. Ele descreve admiravelmente, porém, 30 ou 40 anos depois. O discurso de Pedro reflete a prática das comunidades lucanas, mas faz concessão aos judeu-cristãos (15,19.29).



O texto apresenta problemas:



a) Problemas históricos: há divergências históricas entre At 15 e Gl 1,16-2,14. Porém há mais convergências do que divergência. Estas últimas são relativas.



B) Problemas de conteúdo: Gl 2,10 diz que os apóstolos pediram que Paulo se lembrasse dos pobres. At 15 não fala disso. O decreto apostólico (At 15,20.29) faz exigências, mas Paulo (Gl 2,6) diz explicitamente que os notáveis nada acrescentaram.

Lc escreveu tarde, introduziu 15,20.29 que ele colheu alhures. Não fazia parte do original. Certamente acréscimo da ala judaizante que não podia assimilar a conferência na prática. O decreto apostólico (15,20.29) não tinha razão de ser no tempo da conferência. Este problema da mesa comum não existia em Jerusalém. O problema era a circuncisão. Jerusalém podia admitir à distância que não mais se circuncidasse, mas com o passar do tempo, quando em sua própria comunidade surgiam incircuncisos, aí a questão da mesa se acendeu.

Nasceu então o decreto apostólico, que foi acrescentado à conferência. Lc o recebeu assim.



Talvez o choque de Antioquia (Gl 2,11-14) explique algo.

O decreto apostólico era coisa recente. A igreja de Jerusalém o inseriu em At 15, tendo à frente Tiago. Estando Pedro em Antioquia, manda Tiago seus emissários para receber

o apoio de Pedro. Pedro, diante da pressão aceitou tal decreto. Paulo não aceitou o mesmo. Provavelmente Paulo é derrotado, e, para amainar o problema, o decreto entrou na igreja de Antioquia.

Com esta tese também se poderia explicar a questão com Barnabé (At 15,39-40). Valeria a pena brigar por Marcos?

Parece que o problema é outro (Gl 2,13). Barnabé aceita o decreto apostólico que Paulo rejeitou. Isto provocou a separação dos dois. Barnabé desaparece do cenário, pois um judaizante não faz sucesso missionário.

Nos tempos de Lc este problema devia estar superado (At 10), por isto Lc nem se refere à briga apostólica. Aliás, Lc não quer apresentar um Pedro inconveniente às suas comunidades.

3. Mulher, casa e família 


Na cultura do século I d.C., a mulher não podia participar da vida pública. A sua função restringia-se à vida familiar, onde exercia sua influência, na organização interna da casa (oikia). Como funcionava no interior das casas, a mulher tinha um papel eclesial ativo. A criação de “Igrejas domésticas” possibilitou maior influência e participação da mulher. Desde as origens até hoje, as mulheres chegam para ficar. Mesmo sem serem notadas, sem serem contadas, muitas vezes silenciadas, as mulheres são atuantes nas comunidades. É preciso vasculhar os textos, perceber sua presença e descobri-las atuantes, ontem e hoje.

Os textos bíblicos falam pouco das mulheres, quem sabe, por ser tão evidente a participação delas no dia-a-dia das comunidades. A herança desse primeiro século foi desviada de nós pela corrente que prevaleceu na história — a que “unificou” o cristianismo, considerando-o “ortodoxo”, e descartou a influência e a liderança das mulheres, excluindo-as da plena participação nos ministérios da Igreja.

Lucas menciona diversas mulheres nos Atos dos Apóstolos. Elas animam e lideram comunidades, cheias da força do Espírito Santo. Além de Maria, a mãe de Jesus, Safira foi a primeira mulher citada como membro efetivo e participante nas decisões da comunidade. Ela se solidarizou com a comunidade ao consentir em vender seus bens e colocá-los a serviço da comunidade. Lucas ressalta que o pecado de Safira não foi o mesmo do seu marido Ananias. Safira pecou pelo fato de não ter reagido em público, na assembléia, ao sistema que regia o casamento patriarcal, segundo o qual era muito difícil a mulher agir de modo diferente do modo do marido. Safira acabou sendo conivente e co-autora da traição feita à comunidade e conseqüente traição ao Espírito Santo.

No tradicional texto da instituição da diaconia, nos Atos dos Apóstolos (At 6,1-7), viúvas helenistas, pobres e estrangeiras, aparecem reagindo contra a discriminação (At 6,1s). Lucas não diz que todas as viúvas estavam sendo relegadas na assistência social, mas apenas as viúvas de origem grega. Foi com base no clamor delas que a comunidade se abriu para os helenistas, com a diaconia sendo exercida por homens escolhidos em uma assembléia geral, todos do meio dos excluídos. Com esse relato, Lucas enraizou as comunidades na rica experiência da libertação do Egito, em que mulheres parteiras uniram-se, organizaram-se, rebelaram-se contra um decreto lei que visava controlar a natalidade, e acabaram contribuindo decisivamente para o nascimento de Moisés, abrindo assim o caminho para o processo de libertação que emergia entre os escravos hebreus no Império Egípcio.

Outra mulher que exerceu liderança libertadora nas primeiras comunidades cristãs foi Tabita. Ela é apresentada como discípula atuante na comunidade (At 9,36-43). “Notável pelas boas obras e esmolas que fazia”, efetivou a inclusão de viúvas pobres e estrangeiras na comunidade, trabalhando manualmente (tecendo túnicas e mantos). Semelhante ao apóstolo Paulo, Tabita questionou, na prática, a cultura helenística que desvalorizava o trabalho manual.

Maria, a mãe de João Marcos, descrita em At 12,12-17, aparece como ponto de referência para a reunião da comunidade. Abrir a casa para reunião de pessoas ligadas a um movimento que questionava radicalmente o Império Romano e a cultura helenística poderia desencadear perseguição. Dar guarida a presos políticos, como o apóstolo Pedro, poderia atiçar ainda mais a ira do império e seus sustentadores. A mãe de João Marcos aparece assim como pessoa corajosa que assumiu a responsabilidade do seu compromisso no seguimento de Jesus.

A escrava Rode, citada nominalmente em At 12,12-17, movimentava-se com toda liberdade e participava intensamente dos acontecimentos da comunidade, especificamente do episódio da libertação de Pedro. Ela reconheceu Pedro, de longe, ecoando assim a postura sensível do Pai do filho pródigo. Rode foi a primeira a anunciar a libertação de Pedro, assim como Maria Madalena foi a primeira a anunciar a ressurreição de Jesus. Estaria Lucas querendo insinuar que a escrava Rode tinha a mesma dignidade de Maria Madalena?

Lucas nos fala de Lídia (At 16,13-15.40), uma líder de comunidade. Ela era comerciante de púrpura e liderava um grupo de mulheres trabalhadoras que produzia um tipo de tinta com base na mistura da planta chamada púrpura com urina de animais. Tingiam lãs e roupas e as vendiam. Lídia colocou sua casa à disposição dos missionários, em um sinal de conversão, insistindo para que fossem seus hóspedes.

Lucas enfatiza a presença de uma jovem escrava que fez um contundente anúncio profético: “Paulo, Silas e demais companheiros são servos do Deus Altíssimo e anunciam a todos vocês o caminho da salvação” (At 16,16-18). Aquela jovem escrava captou que Paulo, Silas e companheiros eram enviados de Deus para prestarem um serviço à comunidade de Filipos: apresentar a proposta do evangelho de Jesus. A jovem escrava clamou também por socorro, revelando seu desejo ardente de ser libertada.

Priscila, uma trabalhadora missionária, ocupa um espaço relevante nos Atos dos Apóstolos (At 18,18.26-27). Ela aparece sempre ao lado do seu companheiro Áquila e, provavelmente, aderiu à fé cristã antes de conhecer Paulo. Deve ter sido expulsa de Roma pelo edito do imperador Cláudio, em 49 E.C. Como exilada política, Priscila chegou em Corinto, onde acolheu o apóstolo Paulo em sua casa por um ano e meio. A casa de Priscila se tornou uma “igreja” cristã. Tanto Lucas como o apóstolo Paulo colocam o nome de Priscila sempre antes do nome do seu marido, Áquila. Isso pode indicar sua liderança. Priscila conciliava com destreza o trabalho do lar com o trabalho missionário e a fabricação de tendas.

Lucas se refere, em Atos, de passagem, às quatro filhas de Filipe, dizendo que eram profetisas. Em At 13,1 e 11,27 temos notícia da existência de profetas nas primeiras comunidades cristãs, mas somente em At 21,9 se faz menção à profecia exercida por mulheres. O fato de o cristianismo ter sido, no início, a religião das casas, facilitou a atuação das mulheres nas Igrejas. Lamentavelmente com a institucionalização e a conseqüente hierarquização das Igrejas as mulheres foram sendo marginalizadas.

A teologia lucana ajuda na superação da discriminação das mulheres nas Igrejas. “Urge superar todos os dualismos. A começar pelos dualismos entre as próprias mulheres: judias versus cristãs; ativas versus contemplativas; protestantes versus católicas; leigas versus religiosas; do lar versus profissionais; casadas versus solteiras; heterossexuais versus lésbicas.

Comunidades lucanas revelam um contexto patriarcal e machista. As mulheres, de uma forma geral, eram desprezadas e marginalizadas na sociedade. Mas no Evangelho “de” Lucas, Jesus dá atenção à mulher, valoriza sua presença e atuação na comunidade. “Na narração do nascimento de João Batista e de Jesus (Lc 1,5–2,52) rompe-se o padrão que colocava o homem em primeiro plano e que deixava à margem tanto a mulher como a criança. Nessas narrativas, as crianças são apresentadas junto com a presença atuante de suas mães. Elas é que são protagonistas da novidade, anunciadoras das “grandes coisas que o Poderoso fez” (Lc 1,49), mesmo vivendo em um contexto patriarcal e machista.
Concluindo nosso trabalho


Na Conclusão dos Atos dos Apóstolos vemos que Paulo é testemunha até os confins da Terra ( 28,16-31 cf. 1,8).

Conclusão da obra de Lc (v 16,31). Assim como Jesus (Lc 4,16-30) apresenta o evangelho aos judeus, mas privilegia os pagãos, assim também Paulo anuncia aos judeus, mas acaba indo aos gentios.

“O grande problema de Lc foi explicar como a Igreja, que doravante toma apoio cada vez mais os convertidos dos gentios, constitui a continuação do povo de Israel”.

Depois de Lc, o conceito de igreja pode nascer.

“Na época de Lc os judeus excomungam os cristãos. Trata-se de mostrar que, apesar desta rejeição, o verdadeiro Israel são os cristãos”.

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