Ao lermos o Evangelho deparamos
continuamente com vários grupos religiosos com os quais Jesus entra em
conflito. Entre eles sobressaem os fariseus, os saduceus e os escribas, mas é
preciso, contarmos também com os essénios, herodianos, baptistas, samaritanos e
zelotas. Este estudo dos grupos religiosos ajudam-nos a perceber, pelo
confronto e polémica gerados, a própria pessoa que é Jesus de Nazaré.
Este estudo dos diferentes grupos religiosos e sociais (que frequentemente
tinham conotações políticas) é um elemento essencial da história do povo
bíblico. É difícil dizer, em cada caso concreto, se foi a motivação religiosa
ou política que foi a força inicial que confirmou um determinado grupo. Para
entender esta dificuldade temos de saber, desde logo, que para Israel e para
Judá o político e o religioso não são mais do que aspectos diferentes da mesma
realidade.
Apesar de não se saber ao certo quando é que os fariseus apareceram, sabe-se
que estão ligados aos Macabeus e Asmoneus, por volta do ano de 173 a.C. A
decisão de Simão Macabeu se auto-nomear, em 142 a.C., Rei e Sumo Sacerdote teve
consequências graves junto dos judeus crentes. Por isso, no princípio, os
fariseus eram apenas um movimento piedoso que protesta contra a mundanização
profana do sacerdócio e monarquia dos Asmoneus.
Os fariseus são «santos» (o sentido etimológico da
palavra ‘fariseu’ é «separar» que tem origem na palavra hebraica parash)
separaram-se dos Asmoneus, julgados infiéis. Índigos sobretudo por causa do
sangue que, necessariamente, derramavam nas suas guerras contra os inimigos.
Desta maneira tornavam-se impuros perante a Lei e não podiam, de modo nenhum,
exercer a função de Sumo Sacerdote.
Assim, os fariseus são pessoas piedosas que vivem dependentes do cumprimento
escrupuloso da Lei (até aos mínimos detalhes). Foi precisamente este formalismo
que Jesus não se cansou de denunciar (Mt. 23). Nesta perspectiva religiosa foi
um grupo radical. Viviam entre as pessoas (enquanto os essénios se refugiaram
na comunidade de Qumrân) e acabaram por se tornar numa espécie de ‘directores
de consciência moral’.
Politicamente foi um grupo oportunista, pelo menos no tempo de Jesus, quando
aceitaram serem fiéis ao Imperador Augusto, por imposição de Herodes Magno. Foi
assim que perderam bastante da sua autoridade moral e política junto do povo.
Só depois do ano de 70, após a derrocada de Jerusalém, e terminado o poder dos
saduceus e dos sacerdotes, é que os fariseus voltaram a dominar o mundo judaico
e a salvar Israel de perder a sua identidade religiosa, em confronto com algumas
das primeiras comunidades cristãs.
Os Saduceus são um grupo dentro do judaísmo.
Apesar de, por vezes, se designar o «partido dos saduceus» não podemos
considerar tanto um grupo político mas muito mais religioso. Não sabemos desde
quando existe esse grupo, sendo que a sua origem está no período persa ou
helenístico (536-170 a.C). O nome dos saduceus deriva de Sadoq, (não da palavra
saddîq que significa o justo como muitos pensavam) referindo-se provavelmente a
Sadoq que, junto com Abiatar (2 Sam. 8, 17) - sacerdote do tempo de David.
Sadoq foi considerado como pertencente a legítima família pontifical. Deste
modo, os saduceus têm a pretensão de ser a legítima casa sacerdotal. Por muitos
motivos, ao longo da história, o nome «saduceus» foi perdendo parte do sentido
originário. O característico dos saduceus já não foi o serem filhos legítimos
de Sadoq, mas a disposição espiritual contrária à línea farisaica.
A doutrina dos Saduceus, da casta aristocrática, sobretudo sacerdotal, é mal
conhecida. Eram um grupo pequeno – um grupo sacerdotal em torno do Sumo
Sacerdote. Parecem não reconhecer outra lei que o Pentateuco (e não os
Profetas); ao contrário dos fariseus não crêem na ressurreição nem nos anjos
(Act. 23,8). Religiosamente são tradicionalistas e politicamente colaboram com
os romanos para manterem o seu poder. Controlam o Templo e a sua economia e
dominam o Sinédrio (Supremo tribunal de Israel).
Serão muito duros com Jesus e com o cristianismo nascente. Foram eles que
entregaram Jesus a Pilatos, para ser morto, por motivos religiosos e políticos.
Viram nele um blasfemo e um homem de ideias messiânicas capaz de arrastar
multidões e pôr em perigo a estabilidade religiosa e política que sempre
defenderam. Todavia, não tinham vitalidade religiosa bastante para sobreviverem
ao desastre do ano 70 e desaparecem então da história.
Os Essénios são uma espécie de monges que viviam
em comunidade nas margens do Mar Morto (a sua doutrina passou a ser mais
conhecida depois da descoberta dos manuscritos de Qumrân, por um jovem pastor
beduíno – Muhammad edh-Dhib - em 1947). Foram um grupo que protestaram contra o
sacerdócio mundano e imoral do templo de Jerusalém, assim como contra o culto
vigente no mesmo templo. Assim, criticam, mordazmente, os Sumos Sacerdotes de
Jerusalém como usurpadores do verdadeiro sacerdócio.
Sob a direcção de um sacerdote, chamado Mestre de Justiça, separaram-se dos
outros judeus que julgam muito pouco fervorosos. Em vez de sacrifícios
reuniam-se para participar em banquetes sagrados comunitários. Não se casavam e
viviam do trabalho manual. Todas as propriedades eram comuns, fomentando assim
um espírito de fraternidade. Vivem na oração e na meditação das Escrituras,
preparando activamente a vinda do Reino de Deus. O seu mosteiro será destruído
pelos Romanos em 70. São «fanáticos» e tradicionalistas.
Os Samaritanos,
como o próprio nome indica, eram habitantes da Samaria, descendentes da
população mista (israelita e pagã). Não formam uma seita propriamente dita. Os
Samaritanos afastaram-se do judaísmo oficial. Têm o Pentateuco em comum com os
Judeus, mas construíram o seu próprio Templo no monte Garizim (2Rs. 17, 24-28),
por este motivo os Judeus (habitantes da Judeia – ao sul) consideravam-nos
pagãos. Por isso, as relações entre eles e os Judeus são muito tensas (Cf. Lc.
9,52; Jo. 4,9; 8,48). O comportamento de Jesus a seu respeito vai escandalizar
os Seus contemporâneos (Jo. 4,5-.40; Lc. 10,13; 17,10-17). A missão cristã
desenvolver-se-á primeiro entre eles (Act. 1,8: 8,5-25; 9,31;15,3).
Outros grupos com menor expressão: Zelotas (zelavam pela independência de
Israel); Herodianos (partidários da dinastia de Herodes) e Movimentos Baptistas
(Baptismo como rito de iniciação).
O clero é um grupo bastante hierarquizado. No cume da hierarquia encontra-se o
Sumo Sacerdote. Os restantes sacerdotes do Templo fazem igualmente parte
aristocracia e todos são saduceus. Os sacerdotes rurais andam à volta de 7000.
Muito próximos do povo, partilham a sua vida, ofício e pobreza. Repartidos em
24 secções ou classes, exercem a sua função no Templo, cada um por sua vez,
durante uma semana por ano, assim como nas três festas de peregrinação. Os
levitas, espécie de baixo clero que perdeu todo o poder, são os parentes pobres
do clero. Cerca de 10.000, repartidos também por 24 secções, exercem, uma
semana por ano, no Templo, funções subalternas: preparação dos sacrifícios,
recebimento dos dízimos, música, policiamento do Templo.
Os anciãos são uma espécie de aristocracia laica, de contornos mal definidos.
Aqui há também uma grande diferença entre os chefes de aldeia e o pequeno grupo
de ricos comerciantes ou rendeiros que se senta no Sinédrio de Jerusalém. Estão
agarrados ao seu poder e, por isso, inclinam-se ora para os ocupantes romanos,
ora para o Sumo Sacerdote. Parecem ser saduceus.
Os escribas ou doutores de Lei (a nossa palavra escriba deriva do latim
scribere) são um grupo de Judeus que liam, escreviam e interpretavam as
Escrituras Sagradas. Ao princípio, este múnus estava ao encargo dos sacerdotes
mas, depois do Exílio, os sacerdotes tornaram-se nos senhores do Templo e do
poder, na dependência do Sumo Sacerdote, que era o chefe da nação, uma vez que
não existia rei. No século III a.C., os escribas são sobretudo leigos, mas no
tempo de Jesus há escribas leigos, juntamente com sacerdotes e levitas.
Por volta dos 40 anos, o mestre ou doutor ordenava-se escriba através da
imposição das mãos e ficava com o direito de fazer parte do Sinédrio. Com toda
a sua importância, o escriba acabava por se manifestar como alguém superior e a
quem se deviam honras e uma certa veneração por parte do povo. (cf. diatribe –
Mt 23, 6-7) Têm uma grande influência na sua qualidade de intérpretes oficiais
das Escrituras, tanto na vida corrente como perante os tribunais. Verdadeiros mestres
do pensamento, saídos do povo, partilham muitas vezes a sua pobreza.
Os publicanos são cobradores de impostos mas não são os ricos rendeiros gerais,
antes os seus auxiliares. Contudo, não podemos identificar sem mais como uma
‘espécie’ de funcionários das finanças do tempo de Jesus. No Império pagavam-se
muitos impostos: nas fronteiras, nas estradas e saídas das cidades, nas pontes,
no comércio de mercadorias, nos portos… E os publicanos procuravam cobrar os
impostos por conta do ocupante romano; por esta razão e porque têm tendência
para aumentar os impostos por sua própria conta, são mal vistos e tidos por
pecadores públicos. Não só enganavam as pessoas, como também estavam ao serviço
do Império – duas razões que alimentavam o ódio e o desprezo da população. Cada
província, ou parte dela, era administrada por um publicano, que pagava uma
grande soma anual ao procurador ou tetrarca para poder cobrar todos os impostos
do seu distrito.
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